LUTA DA ALMA:
LINGUAGEM CONTRA A LOUCURA DO SÉCULO XVII
Resumo
RESUMO:
Este artigo trata da loucura como matéria de importantes relatos em textos letrados: a psicomaquia ou luta da alma, entendida como luta da racionalidade da alma contra os efeitos do distanciamento da razão. O artigo faz breve incursão teórica sobre o entendimento da loucura a partir de estudos de Michel Foucauld, e então apresenta o poeta português Antonio Serrão de Crasto (1613 ou 1614 – 1685) como autor de uma luta da alma poética, pensada enquanto era preso do Tribunal do Santo Ofício em Lisboa no século XVII: Os ratos da Inquisição. A partir do entendimento de alegorias, o poema satírico do preso é estudado como imitação de outras lutas pela virtude, a exemplo do livro Psychomachia, de Prudentius (405 d.C.), cujo tema central é a guerra cristã entre virtude e vício. No poema português, a metáfora da peste animal é estendida para fora do assunto da prisão e atinge os cobradores de impostos, aspecto pelo qual a sátira é ampliada ao universo da sociedade católica reformada de Portugal. O poema expõe o arbitrário da prisão, e põe à vista a ação repressiva que tem origem em questões muito complexas, como o antissemitismo, a censura política e religiosa, o ódio da aristocracia contra burgueses e até o estatuto letrado da poesia satírica, posto que Crasto era homem de letras cujo caráter satirista impregnava a recepção de seus textos, inclusive os praticados como membro da Academia dos Singulares de Lisboa.