Faces da História
, Assis/SP, v.6, nº2, p.425-440, jul./dez., 2019
1937 – que institui o tombamento dos bens históricos e artístico nacionais e a criação da
Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN)
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– revela um pouco da
trajetória do intelectual enquanto agente do poder na promoção do patrimônio histórico
e artístico no Brasil (CHUVA, 2012).
A ideia de patrimônio cultural de Mário de Andrade estava assentada na visão de
algo distanciado de um passado glorioso e mais próximo de sua época. Ao mesmo tempo,
ela se distanciava, ainda, das grandes metrópoles e voltava seus olhos para o tradicional.
Em outras palavras, o patrimônio brasileiro, para ele, seria aquilo que estaria presente na
cultura popular e no folclore. Neste sentido, Chuva comenta qual seria a matéria-prima a
ser recuperada como referência para a ideia de patrimônio de Mário de Andrade:
Não um passado que não existe mais, mas justamente a existência, nesse
imenso Brasil, de diferentes temporalidades, encontradas por ele em suas
missões ao interior do Brasil, distante de São Paulo ou das grandes cidades;
distante das elites e da sua erudição europeia e bastante próximo do popular,
encontrado no próprio tecido social, a ser apreendido por meio do que vem do
olhar, do escutar, do saborear, do conversar (CHUVA, 2012, p. 153).
Neste sentido, Mário de Andrade considerava importante para a construção da
nação brasileira as buscas por suas raízes nas tradições. Desta forma, ele foi um
importante nome em pesquisas realizadas durante os anos de 1936 a 1938, que visavam
constituir um inventário do folclore brasileiro, dando subsídios para a criação da
Comissão Nacional do Folclore
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. Logo, a visão desse patrimônio idealizado pelo
intelectual abrangia não somente bens materiais, mas também imateriais. É interessante
comentarmos, também, que Barroso possuía uma proposta de criar um museu
ergológico. Nele, afirma, haveria uma suposta “alma da nacionalidade”, pois o intelecto
estaria situado em outro lugar: que seriam as classes superiores e o Estado que as
comandava. Dessa forma, o folclore fazia parte, na visão de Barroso, da constituição de
um “grande Brasil”, em que cada detalhe seria a parte de um todo maior (BARROSO,
1945). Porém, ainda que o folclore fosse parte da nação, o próprio autor comenta que ele
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Atual Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
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“No Brasil, uma ampla movimentação em torno do folclore e da cultura popular iniciou-se na década de
1950, reunindo nomes como Cecília Meireles, Câmara Cascudo, Gilberto Freyre, Artur Ramos, Manuel
Diégues Júnior, Renato Almeida entre tantos outros. O país de então orgulhou-se de ser o primeiro a
atender à recomendação da UNESCO, criando uma comissão para tratar do assunto – a Comissão
Nacional do Folclore, no Ministério do Exterior. No contexto do pós-guerra marcado pela preocupação
internacional com a paz, o folclore era visto como fator de compreensão e incentivo à apreciação das
diferenças entre os povos. O conjunto das iniciativas então desenvolvidas foi designado como Movimento
Folclórico, implantando diversas Comissões Estaduais de Folclore, algumas atuantes até hoje. Seu apogeu
foi a criação, em 1958, da Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, no então Ministério da Educação e
Cultura. O atual Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, da FUNARTE, com ricos acervos
museológicos, fotográficos, sonoros e bibliográficos, é o herdeiro institucional desse movimento”
(VILHENA, 1997, p. 69).